Músico pernambucano trouxe para São Paulo o show homônimo do seu último álbum ‘Do Meu Coração Nu’ com participação especial de Amaro Freitas
Por tOn Miranda
Que bom e marcante é começar 2022 escrevendo sobre música sobre um artista tão admirável que em pleno 26 de outubro de 2020, foi a data que eu conheci a saborosa e doce voz de um artista que a cada dia vem conquistando um espaço importante e necessário no cenário cultural do nosso país, o pernambucano Zé Manoel. Na ocasião, foi quando eu fiz uma audição particular do seu álbum Do Meu Coração Nu que acabara de chegar as plataformas digitais e que me arrebatou logo na primeira canção. Que intrigante foi ouvir aquele artista preto falando de temas tão atravessadores de uma forma afetiva, fazendo uma “resistência amorosa”, termo que surgiu depois que dois amigos que ouviram Zé Manoel através da minha indicação e que ficaram fãs instantâneos do pianista, cantor e compositor.
Depois desse primeiro encontro com a obra de Zé, o convidei para conversarmos sobre o lançamento do seu álbum no programa Barulhinho Bom, que apresento aqui no Canal Diversão & Arte para falar sobre o universo da música. Depois, mais uma vez o convidei para fazer uma surpresa na gravação que fiz com o cantor, compositor e ator Fábio Ventura, que estava lançando dois singles e um deles tinha participação especial do Zé Manoel, que gentilmente atendeu o nosso pedido e fizemos uma singela surpresa ao artista carioca.
A jornada do álbum Do Meu Coração Nu é uma trajetória marcada por muitas conquistas através dos prêmios que o clipe Adupé Obaluaê foi conquistando desde o seu lançamento até a nomeação do álbum na categoria Melhor Álbum de Música Popular Brasileira na edição 2021 do Grammy Latin.
A experiência da presença física ela concretiza afetos, percepções e imaginários, e todo esse combo se materializou no dia 21 de janeiro de 2022, na última sexta-feira, dia que concretizei a experiência de assistir no palco do Teatro Antunes Filho do SESC Vila Mariana, em Sampa, o show Do Meu Coração Nu, de Zé Manoel, com a participação mais que especial do seu conterrâneo e também pianista, o espetacular Amaro Freitas. Se a experiência de ouvir e ver Zé Manoel já é um profundo mergulho poético para dentro da obra de um artista que não tem pudor de mostrar sua alma nua no palco, apesar da timidez que lhe é característica, mas que lhe dá todo um contorno charmoso, ele ainda presenteia o público convidando o pianista Amaro Freitas, músico festejado e celebrado por muitos dos nossos artistas por todo Brasil, como Milton Nascimento, Criolo, Manu Gavassi, Tim Bernardes e tantos outros.
O show dirigido por Gil Alves, começa com um dos hits do álbum e que abre o mesmo, História Antiga, uma carta no futuro do pretérito que só a voz de Zé Manoel é capaz de fazer com tamanha delicadeza, tratar de temas tão duros e ásperos que é o racismo estrutural e a violência contra o povo preto.
Zé Manoel ainda passeia com seu piano e voz, por outras canções do álbum, mesclando o repertório autoral de outros álbuns como Pra Iluminar O Rolê, Sol das Lavandeiras e Canção e Silêncio, acompanhado pela banda luxuosa formada por Luisão Pereira (baixo e direção musical), Marcos Santos (bateria) e Ênio (guitarra).
A noite ainda foi dedicada a existência ancestral da voz do milênio, a deusa Elza Soares, que nos deixou no dia anterior ao show (20 de janeiro de 2020). Zé lembrou da importância da sua obra e da sua vivência para o Brasil e principalmente para o povo preto que sempre enxergou nela uma potência referencial.
A introdução de Amaro Freitas ao show, não poderia ser melhor, senão com o blues rasgado de uma entidade para a cultura preta mundial, Nina Simone com Blaclash Blues. Além de apresentar um solo estonteante, Amaro ainda fez outro feat com Zé, num outro hit do álbum, que originalmente, Zé Manoel gravou com a cantora Luedji Luna, a canção Não Negue Ternura.
O espetáculo musical foi ainda embalado por projeções pensadas para cada uma das canções, que ainda teve singelas homenagens para dois artistas que participaram do álbum: Guitinho da Xamba do Grupo Bongar e do maestro Letieres Leite que nos deixaram em 2021.
A imersão auditiva que o espetáculo traz, não deixa de fora alguns prelúdios poéticos que Zé, sabiamente, colocou no álbum e trouxe para a ambiência do show, fazendo que o público tenha uma vivência completa como o Escuta Beatriz Nascimento e o poema de Bell Puã.
O show de Zé Manoel não é um show com diversos elementos cênicos e efeitos especiais, pelo contrário, a simplicidade é a grande protagonista do show, que traz essa marca indelével de Zé, que por ser um grande artista é capaz de traduzir e sintetizar complexos temas e assuntos do nosso dia a dia e transformar em simples e palatável. Impossível você entrar num show de Zé Manoel e não ser tocado de alguma forma por sua arte e singeleza.
Que São Paulo (novamente), outras cidades do Brasil e outros países desse mundo, tenham a sorte de receber o coração nu de Zé Manoel e estando lá, que você também saia desse encontro com sua alma lavada e despida.
OBSERVAÇÃO: ainda essa semana, no Canal Diversão & Arte, você irá conferir o programa NOS BASTIDORES desse show incrível que é o Do Meu Coração Nu com Zé Manoel.