Nos últimos tempos temos ouvido constantemente a expressão “serviços essenciais”
– Somente os serviços essenciais estão autorizados a funcionar!
Mas o que podemos entender por “serviços essenciais?”
São todas aquelas atividades que são fundamentais para a comunidade como um todo, sem as quais não poderíamos viver. As mais importantes, sem dúvidas são àquelas relacionadas à saúde (hospitais, farmácias) e alimentação (supermercados, padarias, açougues).
A lista conta com diversos outros itens como: serviços postais e de transporte, construção civil e unidades lotéricas. Alguns dos serviços listados geram controvérsia, como é o caso das academias. Mas existe um serviço, que muitas vezes sequer é levado ao debate: o cultural.
Cultura e Arte
Muitas vezes na escola e na faculdade somos questionados sobre o que é cultura.
São tantas coisas diferentes… Tudo é uma forma de cultura. Aprendi certa vez que aquela plantação de alecrim, boldo e afins no quintal de casa que servem para um chá que acalma, que ajuda na dor do estômago também é uma forma de cultura.
Não só no sentido de plantar e colher, mas fazer chá e ter esses conhecimentos também é um tipo de cultura, é o que chamamos de cultura popular. É sabedoria que vem sendo passada de geração em geração.
Minha bisavó sabia, minha vó sabe, minha mãe também sabe e eu também sei… É um conhecimento que muitas pessoas sabem, não é algo restrito unicamente à família.
E o que é a cultura, senão o conjunto de todos os conhecimentos, sabedorias, tradições e costumes que são manifestados na nossa sociedade. Nem sempre por todos, mas por uma boa parte dela.
Mas, sendo assim, a arte também é uma forma de cultura?
Sim! A música, a literatura, a dança, o cinema, a pintura, o teatro, a escrita… São manifestações culturais. Dentro de cada uma delas existe um pouco de cultura. Existe um pouco dos valores e crenças que o artista tem e coloca em suas obras.
Certa vez a escritora britânica Virginia Woolf nos trouxe a seguinte reflexão:
“Quando pus a caneta no papel, percebi que é impossível escrever sem ter opinião própria.”
O que ela quis dizer é que, sem uma opinião formada, ou melhor, sem um bom repertório, é impossível se expressar em textos. Acredito que isso vale também para todas as manifestações artísticas. Elas trazem um pouco de cada um de seus autores. Um pouco de cada uma de suas vivências, que mudam de acordo com o lugar onde nasceram, viveram, as coisas que experimentaram, religiões que conheceram, livros que leram.
É por isso que o conceito de arte e cultura estão tão atrelados. A arte é a melhor representação da cultura. É seu expoente máximo. Seria a arte, a cultura um serviço essencial?
A ARTE NO DIA A DIA (PRÉ-PANDEMIA)
Na arquitetura
A arquitetura é uma das expressões artísticas que falam muito sobre as pessoas.
Por exemplo, as arquiteturas das igrejas, dos prédios nos centros da cidade. Cada construção fala um pouco sobre sua cidade, seu bairro e sobre seu idealizador também…
E para construir uma casa, um prédio, ou qualquer outro espaço físico, é preciso um bom conhecimento estético, para que os elementos estejam perfeitamente ligados, com harmonia entre si.
Nas esculturas
Pelas ruas, pelos parques, ao redor do mundo ou até mesmo em uma pracinha perto de casa encontramos esculturas que representam uma ideia artística, muitas vezes abstrata.
Nota: Estátuas e monumentos são tipos específicos de escultura, sendo a estátua uma representação de um ser humano e o Monumento uma forma de registrar um momento histórico.
Na pintura
Van Gogh, Picasso, Tarcila do Amaral… Não faltam exemplo de grandes pintores, que representam grandes movimentos e que estudamos nas aulas de Artes (ou educação artística) na escola.
Mas claro que não somente os lendários pintores são artistas. Todos os pintores são. Desde o Di Cavalcanti, até aquele que guarda seus quadros em casa, para si. Todos são artistas.
E não pintam somente em quadros. Pintam em camisetas, em tênis, em prédios e muro com seus belos grafites. Lembrando que grafites não são
Na dança e na música
A dança também é uma das formas de representação da arte. As pessoas, como um todo, não costumam ir tanto a espetáculos de dança, mas acredito que todos reconhecem o quão belo é uma apresentação de balé, e não somente isso: o carimbó, o xaxado, a valsa, a dança de salão, o forró.
Todas essas manifestações corporais entram na categoria artística.
E, claro que é muito melhor dançar com uma boa música ao fundo. E através do uso de instrumentos para produzir sons, conseguimos criar grandes melodias que aliadas a uma boa voz torna-se uma boa música.
Nem sempre são dançantes, mas não deixam de ser uma manifestação cultural, com a qual estamos habituados no dia a dia.
Seja através de plataformas de música on demand no celular, ou na boa e velha frequência de rádio, a música está lá. Nos nossos ouvidos. Chegando onde a TV as vezes não está e onde o sinal da internet é falho.
Na literatura
A literatura também é uma das manifestações artísticas. Ela existe até mesmo antes de todas as outras existirem.
Um bom filme, começa com um bom roteiro. Uma boa música, passa pela escrita, antes de estar produzida e reproduzida nos nossos dispositivos.
O principal expoente dessa manifestação, sem dúvidas são os livros. Tem para todo gosto: mistério, ação, suspense, policiais, comédias, romances… Não faltam opções. Até mesmo a literatura não ficticia pode ser considerada uma forma de arte, afinal, a escrita não deixa de trazer o repertório de seu autor.
No audiovisual
Saiu uma série nova na Netflix, ou uma temporada nova daquele sucesso que te arrebatou no ano passado.
Não contem contigo para nada no final de semana, afinal de contas, você vai estar maratonando aqueles oito, dez, doze episódios, não é mesmo?
Ou então, aquele filme novo no cinema com seu ator preferido, ou da sua diretora preferida. Vai perder a chance de ir assistir em alta definição naquela tela maravilhosa?
O audiovisual – tanto as séries, como os filmes – são a forma de arte mais consumidas do mundo. O cinema, inclusive está listado como uma das belas artes. Já ouviu a expressão “amantes da sétima arte?”
Temos ainda as Artes Cênicas, que não deixam de ser audiovisual. Elas não contam com uma câmera, edição, pós-produção e tudo o mais, mas assim como o cinema usam dos nossos sentidos visuais e auditivos para nos contar uma história, entreter, emocionar e fazer pensar.
E AGORA?
Visando a saúde de todas as pessoas envolvidas nos processos e também como uma forma de evitar a propagação do novo coronavírus, as atividades tiveram que ser suspensas.
A TV Globo interrompeu todas as suas gravações de novelas e séries, os estúdios de cinema e produtoras também estão guardando a quarentena, bem como os grupos de teatro, trupes de danças e diversos setores da sociedade.
Confesso que foi no momento que vi as novelas sendo interrompidas pela primeira vez na história que me dei conta da real gravidade do que estavámos vivendo. No começo do ano jamais imaginaríamos que nossa vida teria essa virada. Tanto que todo o ciclo seguiu naturalmente, inclusive com a comemoração do carnaval de rua. Mas não demorou para que se confirmasse o primeiro caso, o segundo caso, o terceiro e assim por diante… Um home office de improviso para quem nunca havia trabalhado de casa, o fechamento de teatros, cinema, shoppings, parques… Por um momento pensei “E agora?”
Se vira como pode…
Se não podiam mais produzir, os profissionais envolvidos com nossos meios de entretenimento encontraram um jeito de manter a roda girando.
Com relação às novelas, a TV Globo trouxe de volta grandes sucessos para que possamos reviver aquelas tramas, e não ficarmos sem entretenimento.
A Netflix e outras plataformas de streaming ainda tinha um bom conteúdo inédito para ser lançado, mas o trabalho da dublagem foi dificultado, uma vez que as pessoas não podem estar todas reunidas para fazerem esse trabalho.
Aliás, falando nelas, muitas liberaram conteúdos por um bom tempo e aumentaram o tempo de experimentação e promoções durante a quarentena. O Globoplay, plataforma 100% brasileiras liberou seriados de sucesso como Os Normais, A Diarista e Toma Lá da Cá para que não-assinantes possam assistir e ter assim o primeiro contato com a plataforma que também disponibilizou os 102 capítulos da novela das 21h, Amor de Mãe, que teve que ser interrompida no meio das suas filmagens.
Ainda falando em streaming, nossa relação com ele ficou tão próxima, sobretudo durante a quarentena, que os grandes lançamentos do cinema que tinham sua estreia prevista para a grande telona ainda em 2020, estão tendo que recorrer a essas plataformas para que não sejam muito prejudicados.
A Academia de Artes Cênicas e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que organiza a cerimônia e premiação do Óscar, reviu seu conceito e perimitiu que filmes lançados em streaming possam concorrer (excepcionalmente) para a próxima edição, marcada para 28 de fevereiro de 2021.
As apresentações de teatro, por sua vez, ganharam uma nova modalidade. Você compra o ingresso e pode assistir ao espetáculo online. Ainda não sabemos se podemos chamar de teatro essa nova relação, sem uma plateia próxima do palco. Talvez surja um novo nome para isso futuramente, mas o fato é que essa é a forma mais segura para que as apresentações ocorram.
Cada um achou sua maneira de fazer o show continuar…
Nos Estados Unidos, o canal POPTV produziu um episódio animado de One Day at a Time uma de suas séries interrompidas durante a pandemia.
O show não pode MESMO parar?
Todas essas medidas foram tomadas para que a cultura continue viva, para que o entretenimento e o pensamento reflexivo proposto por essas obras continuem atingindo seu público.
O portal de notícias G1 divulgou um estudo feito por um grupo de economistas da cultura pelo Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de MG (Cedepar – UFMG) prevê que a paralisação das atividades culturais causará um prejuízo de mais de R$11,1 bilhões em três meses aqui no Brasil. Segundo eles, a cada R$1,00 perdido na cultura, a economia do país como um todo perde R$1,60.
Os pesquisadores indicam ainda que mais de 70% das pessoas que trabalham com cultura no país, são profissionais autônomos e que a cada 5 profissionais que perdem seu emprego nas atividades artísticas, mais um trabalhador de alguma área relacionada também é mandado embora, totalizando então 6 desempregados.
Assim como os demais setores da sociedade, a paralisação da cultura (shows, cinemas, teatros) indica um prejuízo para os cofres públicos. Não é somente uma questão de ego, ou de querer que seu trabalho seja visto e apreciado.
É sobre manter empregos de diversas pessoas, com famílias.
É sobre ajudar a acentuar a queda da economia.
É sobre ajudar você a não enlouquecer dentro de casa enquanto espera pela vacina.
ALÉM DO FINANCEIRO
As implicações financeiras com certeza são um bom motivo para se achar uma alternativa de “manter as cortinas abertas”. Agora, imagine você que está em casa de quarentena saindo apenas para ir ao mercado, farmácia, ou para trabalhar no caso das pessoas que não tiveram o privilégio do home office.
Imagine você, há quatro meses (e contando) numa quarentena:
Sem quadros e pinturas para admirar
Sem músicas para ouvir ou dançar, mesmo em sua casa
Sem livros, físicos ou digitais, para que possa ler, conhecer novas histórias e aguçar sua criatividade
Sem filmes, séries ou novelas para que possa assistir, se encantar, torcer pelo mocinho, passar raiva com os vilões.
Imagine-se, sozinho, em sua sala… Sem televisão, sem livros, sem aparelhos sonoros, sem roupas estampadas e confeccionadas por artistas. Imagine tudo isso em um período “normal” e nesse novo período que estamos vivendo.
É essencial que as pessoas tenham uma válvula de escape. Que tenham contato com uma obra bem feita que lhe toque a alma, o coração, a mente. Que se sinta um pouco acolhida em meio ao caos. Que sinta que faz parte das confusões de Griselda e Tereza Cristina.
Que sinta o quão importante é a arte e a cultura em nossa vida.
E que saibam que de certa forma, a cultura e a arte são essenciais para nossa vida.