Por Wolf Borges
Sou do tempo do vinil e do CD, lá no longínquo século passado. Fazendo música há algumas décadas, assisto às mudanças com o olhar crítico de quem possui bagagem. E, como toda bagagem, tem guardados importantes mas também um peso para carregar.
Não gosto muito daquele discurso de velho “no meu tempo era diferente”, pois meu tempo é agora, mas às vezes me surpreendo buscando tradições, como uma brincadeira de “rei não bate”, que tem um lugar onde pôr a mão e ficar salvo. Digo dessa busca nas artes onde ela se transformou em algo que parece vazio de essência e conteúdo.
Não se trata de um apego ao passado, como de um cliente tradicional que entra no Café Palhares e pede um KAOL (couve, arroz, ovo e linguiça), mas recebe a resposta do atendente: aqui é a Óticas Carol!
Falo de uma transformação que não leva em consideração o processo de transição, que simplesmente é abandonado.
A história e a tradição são os alicerces que dão sustentabilidade ao novo. E dentro do ovo do novo tem uma vida em potencial.
Minha crítica é que o novo desconsidera o velho e fica envolto em seu gueto de reforços de ego e acaba com isso confinando o “velho” a seu asilo de lembranças com suas meias de tricô.
Como exemplo do que digo – seria mesmo a MPB, uma música extinta no século XX com alguns dinossauros sobreviventes? Vendo alguns dos grandes pilares dessa música envelhecendo, aposentando ou indo embora, fica no percentual decrescente de seus seguidores a sensação de que não tenha quem os substitua em seu legado.
Poderíamos eleger os vilões de sempre, a mídia e os governos, mas encontraríamos também o empobrecimento de horizontes e vocabulário artístico das pessoas que perderam suas referências e identidade. Falta o compromisso de cada um em buscar, além de seus interesses disponíveis em seus algoritmos.
O que fazer também com a falta de poder e oportunidade, quando os próprios curadores dos editais de cultura, não conhecem e não reconhecem nada além de seu mundo de compadrio e ideologias? E assim os últimos críticos sobreviventes, aliados aos curadores, promovem mais um pouco do mesmo, como um instinto de sobrevivência de massa falida.
O que se sabe é que tem muita bala perdida e pouco alvo. Em época de incertezas quem tem um olho (ou um ouvido) é rei.